Materiais de História

Atividade Anos Finais: análise de documento sobre a abolição

Resumo: Atividade voltada para os Anos Finais e para o EJA sobre a Abolição da Escravidão no Brasil. Envolve a leitura de um poema de Bertold Brecht, a comparação de dois textos didáticos sobre a abolição e a análise de um documento histórico. Ótimo para inícios de cursos e para envolver os alunos numa atitude historiadora.

Habilidades: EF08HI19, EF08HI20.

Descrição da Atividade

Esta atividade é bem interessante e aborda uma discussão importante: a memória sobre a abolição da escravidão no Brasil.

A atividade consiste de duas etapas: a discussão de um poema de Bertold Bretch e a análise de um documento histórico. Para encerramento e possível avaliação dos alunos, há alguns exercícios sugeridos ao final do material.

  • Parte 1 – O poema “Perguntas de um trabalhador que lê”

Para introduzir a aula, faça uma leitura dirigida do poema “Perguntas de um trabalhador que lê”, de Brecht.

Este poema é um recurso valioso para os professores de história, pois questiona a tendência das narrativas oficiais em valorizar as ações dos “grandes homens” (de elite), enquanto excluem a contribuição e a agência histórica dos trabalhadores.

Tal questionamento pode ser facilmente entrelaçado com o repertório prévio dos alunos sobre história.

Por exemplo, você pode perguntar sobre os personagens históricos que os alunos lembram de cabeça. Provavelmente, o resultado da pesquisa trará basicamente personagens pertencentes às elites de seu tempo, com poucas menções a trabalhadores, mulheres e escravizados.

Isso reforça a importância do poema e a necessidade de repensar a história a partir de um ponto de vista mais plural e diverso.

  • Parte 2 – Textos didáticos sobre a escravidão

Aqui, explique aos estudantes que eles devem ler dois parágrafos de livros didáticos que explicam o fim da escravidão no Brasil (Texto I e II). Explique que eles devem comparar os textos e identificar o argumento e os protagonistas históricos de cada um deles.

Em seguida, eles devem realizar a análise de um documento histórico (texto III). Além da leitura, espera-se que eles tentar relacionar o documento com uma das explicações lidas anterioremente no texto I e II. Em outras palavras, os alunos devem determinar qual das duas explicações o documento sustenta.

Nessa etapa, os alunos podem experimentar uma “atitude historiadora”, já que podem comparar hipóteses explicativas à luz de uma fonte histórica, avaliando suas fragilidades ou competências argumentativas.

Você pode também abordar a discussão sobre a natureza da produção do conhecimento histórico, se desejar

Para encerrar, peça que os alunos leiam os exercícios e respondam adequadamente.

Poema: Perguntas de um trabalhador que lê.

Quem construiu a Tebas de sete portas?

Nos livros estão nomes de reis:

Arrastaram eles os blocos de pedra?

 

E a Babilônia várias vezes destruída

Quem a reconstruiu tantas vezes?

 

Em que casas da Lima dourada moravam os construtores?

Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muralha da China ficou pronta?

 

A grande Roma está cheia de arcos do triunfo:

Quem os ergueu?

Sobre quem triunfaram os Césares?

 

A decantada Bizâncio

Tinha somente palácios para os seus habitantes?

 

Mesmo na lendária Atlântida

Os que se afogavam

gritaram por seus escravos

Na noite em que o mar a tragou?

 

O jovem Alexandre conquistou a Índia.

Sozinho?

 

César bateu os gauleses.

Não levava sequer um cozinheiro?

 

Filipe da Espanha chorou,

quando sua Armada naufragou.

Ninguém mais chorou?

 

Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.

Quem venceu além dele?

Cada página uma vitória.

Quem cozinhava o banquete?

 

A cada dez anos um grande Homem.

Quem pagava a conta?

 

Tantas histórias.

Tantas questões.

Os textos 1 e 2 apresentam duas visões diferentes sobre um mesmo fato histórico: a abolição da escravidão.

Leia ambos os textos e identifique como cada um deles explica a libertação dos escravos, bem como quem são os “heróis” e protagonistas de cada versão.

Texto 1:

E é com bela caneta de ouro que ela [Princesa Isabel] assina a lei que a Nação enternecida cognominou de “áurea”. Na rua, a multidão em altos gritos exige a presença de Isabel. E a princesa aparece à janela, tendo ainda na mão a pena que acabou de dar a liberdade à raça negra do Brasil. Na praça inteira, o povo agita os braços festivamente, em pleno delírio:

Redentora! Redentora! Redentora!

E, quando o som da rua se vai apagando, no salão uma voz se destaca, num brado que a todos surpreende:

“Meu Deus! Meu Deus! Já não há mais escravos em nossa terra (…) O que se segue depois que Isabel, com sua assinatura, sanciona a lei, são festas. (…) Festas nas ruas, festas nos corações. Festa no coração dos negros, que ficaram livres do cativeiro que os atormentava. Festa também no coração dos brancos, que livres ficaram da nódoa que lhes desonrava a Pátria.

CORRÊA, Viriatto. História da liberdade no Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974, p. 203- 204. In: VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo: Scipione, 2005, p. 297.

Texto 2:

O título de “Redentora”, consagrado por muitos livros de História oficial à Princesa Isabel, não passa de mais um engano com que costuma ocorrer em nossos cursos de História. A Abolição não proveio do bondoso coração da regente. Foi produto de uma luta longa, muitas vezes violenta, sangrenta, cheia de heróis anônimos.

Muitos escravos pressionaram o governo imperial com revoltas  organizadas ou fugas para quilombos e para as cidades. Havia também aqueles que se organizavam para a compra de sua liberdade com seu próprio dinheiro, e outros que formavam sociedades para compra da liberdade de colegas escravos. Seja a forma escolhida, não podemos entender a abolição sem lembrar da luta e da pressão construída pelos escravos.

MENDES, Jr., Antônio e MARANHÃO, Ricardo. Brasil história: texto e consulta. República Velha. São Paulo: Brasiliense, 1983, p.127-8. In: VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo: Scipione, 2005, p. 297.

Texto 3: Documento Histórico

A década de 1880 foi marcada por uma série de fugas e revoltas de escravos, especialmente na província de São Paulo.

Em maio de 1879, por exemplo, o delegado de polícia de Limeira teve que solicitar uma força de trinta soldados para conter a sublevação (revolta) dos escravos da fazenda de Sampaio Peixoto. Além de Limeira, há relatos de que as áreas rurais eram percorridas por bandos de negros armados, determinados a tudo para “conquistar sua liberdade”.

Durante suas jornadas pelas vilas, cidades, estradas e matas, grupos iniciais de escravos que escapavam de alguma fazenda eram reforçados por outros, o que gerava grande preocupação entre os proprietários.

Um exemplo marcante dessas fugas coletivas que inquietaram os senhores ocorreu em Piracicaba, em 1887. Vejamos o relato do chefe de polícia da época sobre a situação:

 

                        “O presidente da província teve conhecimento por telegramas de fazendeiros de Itu, Indaiatuba, Capivari e Piracicaba, que grande número de escravos tinha se revoltado e vagava por aqueles municípios, fugindo do serviço de seus senhores e exigindo que concedessem imediatamente carta de liberdade e pagamento de salário. A polícia confirmou esta informação, e ainda acrescentou que uma leva de cerca de 130 escravos do Barão da Serra Negra se rebelaram no município de Piracicaba, fazendo quase vítima da revolta o referido Barão, e que os dois grupos rebeldes se encaminhavam para uma rebelião geral. Sendo assim, o presidente da província decide o envio de uma força adicional de cerca de 46 praças de cavalaria e infantaria para a região, evitando maiores desastres.”

 

Naquela época, percebia-se que se aproximava um momento de acerto de contas, no qual os senhores poderiam sair prejudicados, pois as forças policiais disponíveis dificilmente conseguiriam conter uma rebelião generalizada. Sem dúvida, esse temor acabou por acelerar o processo de abolição da escravidão.

Atividades:

  1. Qual a crítica que o poema de Bertolt Brecht faz sobre a “história oficial”?
  2. É possível afirmar que a história considerada “oficial” respeita a diversidade de memórias e classes sociais ou ela acaba privilegiando um grupo específico? Justifique.
  3. Como o texto I e o texto II explicam a abolição da escravidão? Quem é(são) o(s) principal(is) protagonista(s) em cada um deles?
  4. Após a leitura do documento histórico no texto III, responda: ele serve como fundamento para os argumentos do texto I ou II? Justifique.
  5. Em sua opinião, a memória oficial deveria valorizar o passado dos trabalhadores em monumentos, datas comemorativas e narrativas didáticas? Explique seu ponto de vista.
  6. Estabeleça uma relação entre o poema lido as versões da história da Abolição da escravidão do Brasil.
  1. O poema de Bertolt Brecht critica a narrativa oficial da história ao questionar quem são os verdadeiros protagonistas dos acontecimentos históricos. Ele destaca a ausência dos trabalhadores e das classes populares nos relatos oficiais, questionando a memória oficial sobre os eventos.

  2. A história considerada “oficial” muitas vezes não respeita a diversidade de memórias e classes sociais, privilegiando as elites de cada época. Isso ocorre porque os relatos históricos frequentemente são escritos a partir da perspectiva dos vencedores, deixando de lado as experiências e lutas das classes oprimidas.

  3. No texto I, a abolição da escravidão é explicada como um ato de benevolência da Princesa Isabel, que é retratada como a “Redentora”. Ela é vista como a protagonista que assina a lei de abolição e é celebrada como a responsável por libertar os escravos. Já no texto II, a abolição é vista como resultado de uma luta longa e muitas vezes violenta, liderada pelos próprios escravos e por outros grupos sociais. Os protagonistas são os heróis anônimos que lutaram pela libertação, não a figura da Princesa Isabel.

  4. O documento histórico no texto III serve como fundamento para os argumentos do texto II. Ele evidencia as revoltas e fugas de escravos, demonstrando que a abolição não foi um presente concedido pela elite, mas sim uma conquista conquistada com luta e resistência dos próprios escravos e de outros grupos sociais excluídos.

  5. Sim, a memória oficial deveria valorizar o passado dos trabalhadores em monumentos, datas comemorativas e narrativas didáticas. Isso porque as experiências e lutas das classes oprimidas são parte fundamental da história de um país e merecem ser reconhecidas e celebradas, contribuindo para uma narrativa mais inclusiva e precisa da história.

  6. O poema de Bertolt Brecht e as versões da história da abolição da escravidão do Brasil destacam a importância de questionar as narrativas oficiais e reconhecer a contribuição das classes oprimidas para os eventos históricos. Assim como o poema, o texto II enfatiza a luta e resistência dos escravos como principais agentes na conquista da liberdade, contrastando com a versão oficial representada no texto I, que atribui a abolição a uma figura nobre e benevolente. Ambos apontam para a necessidade de uma visão mais crítica e inclusiva da história.

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