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Dossiê da Independência – a data do Sete de Setembro e sua criação

Resumo: O texto abaixo foi elaborado para questionar a memória oficial sobre o Sete de Setembro, levantando hipóteses sobre interesses políticos envolvidos na construção de sua memória. Ideal para Ensino Médio e EJA, acompanha alguns exercícios simples de interpretação e reflexão sobre a natureza das construções da memória oficial.

Habilidades: EF08HI22, EF08HI15 e EM13CHS101.

O Sete de Setembro e suas concorrentes

A imagem de Dom Pedro I sacando a espada no alto do Ipiranga é um dos quadros mais conhecidos da história do Brasil. Aparece em quase todos os livros didáticos e ressurge anualmente nas redes sociais em setembro, devido às comemorações da Independência. Diante dela, temos a impressão de sermos testemunhas do evento histórico, aceito naturalmente como o “marco inicial” da fundação da nação. No entanto, essa imagem é fruto da imaginação de um artista que nem mesmo tinha nascido no momento em que o episódio ocorreu.

Na verdade, foi preciso várias décadas para que o hoje famoso episódio do “Grito do Ipiranga” ficasse conhecido como o “Dia da Independência”. Como revela a pesquisadora Cecília Helena Salles de Oliveira, a data de 7 de setembro não foi considerada como a independência do Brasil, nem pela imprensa, nem pelo próprio d. Pedro.

Em carta dirigida aos paulistas no dia seguinte, 08 de setembro de 1822, o príncipe D. Pedro fala da necessidade urgente de retornar ao Rio de Janeiro em função de notícias recebidas de Portugal. Na longa carta não há sequer uma referência ao famoso “grito” do Ipiranga, mostrando sua pouca relevância. Na verdade, nem mesmo a independência do Brasil não estava concretizada, pois a maioria das províncias da América Portuguesa sequer tinha aderido ao novo país.

Da mesma forma, os jornais de época não traziam quaisquer menções ao 7 de setembro. O Correio Braziliense, por exemplo, publicou uma notícia declarando a data de 1º de agosto como marco da independência. Era a data em que o príncipe enviou o “Manifesto às Províncias do Brasil”, no qual orientava as províncias a desobedecer às ordens de Lisboa.

Já redator do jornal Regulador Brasileiro apontaria a data de 12 de outubro – quando d. Pedro I foi aclamado Imperador do Brasil – como o dia do nascimento da jovem nação. Outras datas, como o 9 de janeiro, dia do “Fico” – em que d. Pedro I recusou-se a embarcar para Portugal desobedecendo as ordens de Lisboa – ou a de 1o de dezembro, data da coroação, foram mencionadas. Mas não o 7 de setembro.

Figura de Dom Pedro I no quadro de Pedro Américo, "Independência ou Morte".

E por que então comemoramos hoje o Sete de Setembro?

O Sete de Setembro só ganhou espaço como a data da independência ao longo da década de 1820, em uma estratégia que buscava enaltecer a imagem pessoal de Dom Pedro I. Era um período difícil para o Imperador, já que seu governo sofria crescentes questionamentos e críticas internas, especialmente pelo seu caráter autoritário e centralizador.

Dessa forma, a escolha do “Grito do Ipiranga” apresentava uma versão em que a Independência era vista como resultado exclusivo das ações de Dom Pedro, o que o elevava à posição de “imperador-herói”. Através dessa narrativa, a ideia era transmitir que foi ele, quase sozinho e com muita bravura, quem fez do Brasil um país independente. Em meio a um momento conturbado na política, a criação dessa memória simpática do Imperador viria bem a calhar.

Para reforçar essa versão da história, em 1825, o 7 de Setembro coincidiu com o anúncio do reconhecimento do Brasil pela Grã-Bretanha, o que tornou possível ao escritor Carl O. Schlichthorst declarar que essa era “a data mais importante da história do Brasil imperial”. O próprio Dom Pedro I teria distribuído pessoalmente, das janelas do palácio, cópias desse tratado para enaltecer a data e a narrativa, em um esforço para cristalizar a comemoração em contraposição às suas “concorrentes”, como o 12 de outubro ou o primeiro de dezembro.

Assim, o Sete de Setembro, amplamente conhecido nos dias de hoje, foi selecionado e teve sua lembrança forjada durante as crises políticas do Primeiro Reinado, como parte de um esforço intencional para exaltar a imagem de Dom Pedro I como um “herói” nacional. Essa data se tornou oficial e se espalhou por várias formas de comunicação, inclusive em nosso calendário de feriados e mesmo em nosso Hino Nacional. No entanto, naquela época, as pessoas não viam nossa independência da mesma forma, e ela não representava efetivamente a consolidação do Brasil como nação independente, já que muitas províncias só aderiram ao novo país depois da data celebrada.

Exercícios

1) Segundo o texto, o Sete de Setembro sempre foi visto como a data da independência? Por que?
2) Quais os motivos levaram à escolha do Sete de Setembro como data oficial da independência?
3) O quadro “Independência ou morte” contrasta ou reforça a memória construída em torno do Sete de Setembro? Justifique.
4) A partir do texto, explique qual a importância do uso de documentos históricos, como cartas e jornais, para refletir sobre a história do Sete de Setembro.

1. Segundo o texto, o Sete de Setembro não sempre foi visto como a data da independência. Isso se deve ao fato de que, na época, nem mesmo a imprensa nem o próprio Dom Pedro consideravam essa data como o momento da independência do Brasil.

2. O Sete de Setembro ganhou espaço como a data da independência ao longo da década de 1820, como parte de uma estratégia para enaltecer a imagem pessoal de Dom Pedro I. Em meio a um período difícil de críticas internas, a escolha dessa data apresentava uma versão da história em que a independência era vista como resultado das ações exclusivas de Dom Pedro, elevando-o à posição de “imperador-herói”.

3. O quadro “Independência ou Morte” reforça a memória construída em torno do Sete de Setembro. Ele representa visualmente o momento emblemático do “Grito do Ipiranga”, contribuindo para a narrativa de que a independência foi resultado das ações heroicas de Dom Pedro I. Essa representação fortalece a versão da história que associa o Sete de Setembro à independência do Brasil.

4. O uso de documentos históricos, como cartas e jornais, é fundamental para refletir sobre a história do Sete de Setembro, pois revela que essa data não foi imediatamente reconhecida como o momento da independência. Cartas de Dom Pedro I e notícias de jornais da época mostram que outras datas foram consideradas como marcos da independência, evidenciando que a memória em torno do Sete de Setembro foi construída ao longo do tempo, por meio de estratégias políticas e narrativas específicas. Esses documentos fornecem insights importantes sobre como eventos históricos são interpretados e celebrados ao longo do tempo.

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